domingo, 31 de outubro de 2010

Judas

Quando nos plantaram o cadáver de Cristo, nos induziram a crer em muitas obviedades. Nos deram um vilão, Judas, e um motivo torpe, o dinheiro.
O cristianismo se enraizou em terreno perigoso. Já naquela época, dois milênios e meio atrás, a fúria e o descontrole populares cresciam a olhos vistos. Um alto questionamento sobre ordens e impostos, a falência moral dos ídolos e a busca por novas crenças e liberdades colocavam em risco o controle das massas. Pregadores que se intitulavam 'cristo' surgiam aos borbotões. Um deles, um dos tantos homens que curavam leprosos, que traziam a visão a pessoas cegas e desafiavam a morte ressuscitando, foi o cristo, literalmente.
Esse curso normal da crença, a marcha inexorável das religiões, não nos assusta. Mas uma coisa que até hoje ainda enche de perplexidade aqueles que se detém ante o fabuloso conto bíblico: é a farsa sobre o comportamento de Judas.
Tal qual um cadáver e a cena do crime repleta de pistas e indicações, a entrega de Judas como boi-de-piranha foi óbvia demais. Contar a saga do coitado seria enfadonho e fora de propósito. Mas vale ressaltar alguns detalhes.
A traição por parte de Judas, entregando o cristo aos soldados por dinheiro é óbvia demais. Seria essa uma necessidade urgente naquele momento..., é infantil e nos ofende. Judas, biblicamente, foi um dos homens de confiança de Jesus. Um soldado leal de cujos serviços o presumido filho do deus cristão usufruía sem restrições. Nada mais óbvio e inocente que atribuir a tal personalidade uma traição. É um paradoxo que nos fascina em novelas e contos policiais já há tantos anos, um contrapeso literário de estilo reconhecido, oriundo da nossa necessidade humana de chocar. Culpar mordomos, pais, filhos e fiéis escudeiros vem da nossa vontade de, ao mesmo tempo em que se narra um fato cruel, embasbacar a platéia pela traição. Até hoje essa cantiga de roda, essa cantilena malfadada é ensinada aos pequenos em igrejas. Padres apodrecidos pela política e desfocados das questões espirituais pregam o conto e o disseminam como ditadores. O beijo de Judas, a agressão praticada em bonecos com seu nome, o símbolo de traição e vilania que se tornou esse personagem, nada mais é que uma das pernas secas e mortas do polvo que é a IGREJA, o CATOLICISMO ou se preferirem, o CRISTIANISMO. Manquitolando, ferida de morte, se arrasta essa podridão eclesiástica.
E Judas? Sei lá, deve ter ganhado bem mais do que parcas moedas de prata. Pode ter vendido seu nome, enforcado um corpo qualquer e ter vivido em algum paraíso fiscal da época. Parece brincadeira, mas não seria isso que faríamos hoje em dia?
André Machry

“...Jesus me chama em particular e diz: “Afasta-se dos outros e eu poderei falar-lhe sobre os mistérios do Reino. É possível você alcançá-lo, mas padecerás de extremo sofrimento.” Indaguei a mim mesmo, “quais serão essas revelações?” Como um flash Ele leu o meu pensar e disse: “Você tem a tarefa maior: sacrificará o corpo que carrega o meu espírito. E há conseqüências. Você cairá em desgraça por gerações, mas um dia estará acima disso. Mostrarei um mundo superior, você estará lá...”.
Para mim, as palavras eram como punhaladas que penetravam em minha alma.É difícil aceitar está decisão, é como um rio que não pára de correr. Dá saudades das nascentes do batismo, dos riachos das parábolas e das corredeiras vinda das aulas do Mestre onde me fazia pensar dias a fio. Por isso que ele avisou, pelo menos três vezes, a sua morte era certa. Inclusive revelou que a traição surgiria no meio de nós. E os apóstolos incluindo a mim, muitíssimo contristados, começaram um por um a perguntar-lhe: Porventura, sou eu, Senhor?
De imediato, uma luz surgiu em minha mente e clareou a idéia que o Mestre revelou. O seu ministério completou aqui na terra e sua volta ao céu era urgentíssima. Para tanto, era necessário dar um fim no seu corpo carnal que aprisionava o espírito divino. Tomei coragem e cumpri à risca as ordens. Imediatamente procurei os sacerdotes para entregá-lo, e pedi uma ninharia de trinta moedas.
Por um momento pensei que estava traindo-O, era quase certo que estaria louco, e, portanto, mereceria compaixão, ou pelo menos uma cura. E pela loucura me precipitei de alto a baixo.”

Atenciosamente,
Judas Iscariotes

Texto retirado do blog CFPG (Confraria dos Pensadores Fora da Gaiola), de Hubner Braz


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